sexta-feira, 10 de junho de 2011

A Outra Independência

Muito se fala hoje em dia sobre a importância e a necessidade de criarmos filhos independentes. Embora seja difícil cortar o cordão umbilical é grande o número de pessoas que compreende a urgência de formarmos seres mais evoluídos, auto-confiantes e que saibam ouvir seu próprio coração e seguir seu destino a caminho da tão sonhada felicidade.

Em meio a tantas discussões sobre independência é comum ouvirmos as pessoas - especialmente os jovens - dizerem que almejam sobretudo a independência financeira. Natural, considerando-se que vivemos em um mundo em que se você tem dinheiro tem tudo. Ou pelo menos parece ter. Quem é independente financeiramente geralmente não depende de pai, mãe, marido ou irmão para fazer o que bem entender da sua vida e, infelizmente, em alguns casos ainda usa essa sua situação privilegiada para tentar controlar a vida dos outros que eventualmente dependam dele ou dela. A independência financeira está associada ao último dos desejos do homem. Aquele que ele sente que lhe foi roubado e que, mesmo que inconscientemente, todos nós queremos de volta: a liberdade.

Mas será que finalmente lograr a independência financeira significa ser mais livre do que se era antes de possuí-la?

Na minha concepção, não. Apesar de eu concordar que ela seja importante, de me agradar muito a idéia de eu ter condições de me sustentar com meu trabalho, e de querer que meus filhos também tenham, acredito que haja um outro tipo de independência mais imprescindível. E é essa independência que eu quero passar para meus filhos, antes mesmo de tentar ensiná-los o caminho da independência financeira. Quero ensiná-los a serem independentes do dinheiro. Mas isso é indiscutivelmente mais difícil de se fazer do que simplesmente mostrar-lhes como ganhar o próprio sustento!

Ser independente do dinheiro é muito mais do que não ser escravo dele. Essa expressão, "ser escravo do dinheiro" normalmente está associada a pessoas muito abastadas que esbanjam e só pensam em enriquecer mais ainda, enquanto eu acredito que qualquer um possa e deva aprender a ser independente do dinheiro, não só os ricos.

Ensinamos nossos filhos a serem independentes financeiramente já ao alfabetizá-los. Acreditamos que os impulsionaremos cada vez mais nessa direção quanto melhores forem as escolas que eles freqüentarem, o número de línguas que eles falarem, as notas que eles tirarem. Mas e se isso tudo der errado? E se por um golpe do destino nossos filhos de repente se virem sem um tostão, numa situação financeira muito pior do que aquela a que estavam acostumados?

Me lembro de uma vez em que conversava com meu pai sobre uma crise econômica e um billionário que havia cometido suicídio porque havia perdido milhões. Mas... um bilionário, quando perde "apenas" milhões, não continua rico? Sim, esclareceu meu pai. Mas para o padrão de vida a que ele está acostumado, é o fim do mundo passar de "billionário" a "milionário". E no "desespero" ele decide acabar com sua própria vida. Meu marido diz: "Pobre quando fica rico rápido se deslumbra e perde o chão, e rico quando fica pobre rápido se desespera e vai para debaixo dele!". Não podia estar mais com a razão.

Ser independente do dinheiro é ser verdadeiramente livre. É saber viver com pouco e ainda assim ser feliz e realizado/a, como naquela música "Moça Rebelde" do Vítor e Leo. E não estou falando aqui só de coisas românticas como apreciar as coisas simples da vida, o nascer do sol e etc., etc., etc.. Estou falando de conseguir levar o cotidiano adiante mesmo perante um eventual empobrecimento instantâneo e inesperado, sem perspectiva de retorno ao padrão de vida antigo.

Mas então, como fazer para ensinar nossos filhos a serem não só independentes financeiramente mas também independentes do dinheiro? Não mimá-los demais já é um bom começo! E estou falando de coisas materiais, não de amor - se este for amor de verdade, e não um controle mascarado, é claro. Mostrar-lhes o valor do dinheiro também vale, embora esse seja um clichê. Como se mostra o valor do dinheiro a um filho? É muito mais difícil do que se pensa.

Não adianta dar a ele de tudo e então levá-lo a uma região miserável para que ele veja o quanto ele é privilegiado. Isso não o fará dar valor ao dinheiro. Também não estou falando de privá-lo de todos os tipos de conforto só para não estragá-lo. Tudo com equilíbrio.

Quero dizer que precisamos mostrar-lhes parâmetros do que é aceitável. Por exemplo, uma variação do quanto é justo pagar por algo, como uma bolsa ou um carro. Dessa forma, mesmo que seu filho um dia se torne milionário, não fará a besteira de gastar R$ 1.000.000,00 num carro ou R$ 3.000,00 numa bolsa. Ele saberá que isso é esbanjar e, na minha opinião, assinar um atestado de burrice.

É muito fácil se acostumar a um padrão de vida melhor mas é uma tarefa árdua e um exercício de evolução se adequar a um padrão mais baixo. E nunca se sabe que rumo nossa vida tomará. Quando se tem parâmetros concretos, é mais fácil evitar se deslumbrar na fartura ou se desesperar na crise. É necessário ser pé-no-chão.

Não se trata aqui de ser mão-de-vaca, apenas a saber se impor limites do que é básico e o que é supérfulo. O que é luxo e o que é necessidade.

Eu penso em dar mesada conforme eles realizam tarefas para ajudar em casa por exemplo (não, não é exploração de crianças!) e ensiná-los a administrar seus gastos com planilhas no Excel como eu faço. Noções de economia (incluindo doméstica) e de investimentos também têm espaço nos meus planos (detesto fazer planos mas é inevitável!).

Outra forma é incentivá-los a trabalhar quando eles já tiverem uns 15, 16 anos. Não trabalhar um expediente inteiro, por suposto, mas fazer algo útil naquelas férias em que não vão viajar por exemplo. Aqui no Brasil não é comum mas lá fora é. Jovens adolescentes de todas as classes sociais passam as férias trabalhando como vendedores em loja, caixa de supermercado, atendente no McDonald's. E isso lhes traz uma experiência de vida importantíssima além de ajudá-los quando eles eventualmente tiverem que decidir por uma carreira.

Mas o que eu acho que mais fará a diferença, será se conseguirmos ensiná-los a serem "well-rounded". Desculpe a expressão em inglês mas ela sintetiza bem o que eu quero dizer. Uma pessoa "well-rounded" é aquela que possui habilidades numa variedade de áreas ("well" = "bem", e "rounded" vem de "round", "redondo", ou seja, que cerca e abrange vários lados). Gostaria de poder educar meus filhos de forma que eles saibam cozinhar mais do que um miojo e um ovo frito, saibam costurar, tenham noções de elétrica, hidráulica, mecânica, medicina, física, química, biologia, línguas...

Quero eu então súper filhos!? Súper dotados, gênios!? Não, longe disso! Eu mesma fui sempre a primeira da classe e isso não me agregou nada. Só perdi tempo demais com os livros. Tempo este que eu poderia ter passado vivendo e vivenciando mais e aprendendo coisas da vida na prática, coisas que realmente me serviriam na fase adulta.

Estou falando de um conhecimento geral e obviamente mais superficial. Não quero um chef, uma estilista famosa, um Einstein da vida (embora se eles forem também não vou reclarmar, hehe!). Apenas me encantaria se eles conhecessem um pouco de todas essas coisas.

Mas o que isso tem a ver com ser independente do dinheiro? Tudo. Imagine que você de repente se vê contando os centavos e um cano em casa estoura. O quê você faz? Chama o encanador. Que vai te cobrar... mas você não tem dinheiro! Se você tem noções de hidráulica, você pode você mesmo ir comprar as peças necessárias por um preço justo, executar o serviço e não ter que pagar a mão-de-obra. Tá certo que às vezes ficaria uma gambiarra mas estamos falando de uma situação financeira apertada. De saber se virar sozinho. Você não depende de ninguém nem do dinheiro para resolver seu problema. Só de você mesmo. E é por isso que quem não é rico também precisa aprender a ser independente do dinheiro.

Hoje tenho umas cinco calças que precisam ter a barra feita para ontem. Mas, como não sei costurar, tenho que mandar na costureira. Se eu soubesse costurar, se tivesse aprendido com minha avó que tinha isso como profissão, eu já estaria desfilando por aí com minhas calças novas e estaria economizando uns reais.

Mas mais do que te ajudar a economizar, conhecer um pouco de várias áreas pode te ajudar quando você inesperadamente se vê sem colocação no mercado de trabalho e precisa arranjar um ganha-pão qualquer. Quem sabe um pouco de tudo nunca fica sem serviço. Quem não sabe fica preso, escravo de um nicho.

Nâo estou dizendo que não se deva fazer faculdade, mestrado e quem sabe doutorado e especializar-se em algo - embora eu ache sim que o Brasil perde muito por ser um país em que "para ser publicitário tem que ser formado em Publicidade", etc.. Mas acredito que o ser humano é tão complexo, intrigante e interessante, que isolar-se numa área e ficar alheio a outras é um atraso de vida. Sem falar que alguém cujos interesses se espalham por muitas disciplinas sabe lidar melhor com todos os tipos de pessoa e tem sempre assunto para conversar. Vale a máxima de que "uma pessoa interessada é uma pessoa interessante". E nós bem sabemos o quanto vale nesta vida ser uma pessoa interessante.

Por tudo isso acredito que é fundamental incentivar nossos filhos a terem hobbys. Mas acredito que estes interesses tenham que florescer naturalmente se não não será prazeroso para eles e o tiro sairá pela culatra. As outras coisas que não lhes instigarem tanto, têm sim que ser ensinadas, mas de forma leve, nada forçado. Apenas para que eles mais tarde tenham aquele conhecimento caso lhes seja necessário.

"E como ensinar meus filhos sobre jardinagem, navegação, mecânica, se eu não sei nada sobre isso!?" Se tiver condições financeiras (ah, sempre o dinheiro!) coloque-os num curso daquilo que mais os interessar (é importante tentar não forçá-los a seguir um caminho específico que é o SEU sonho e não o deles) e procure passar o que sabe. O que você não sabe, certamente um amigo, um parente ou um conhecido saberá e terá prazer em ensinar. Só não vale entupir a criança de cursos e não passar tempo com ela! Aí sim vai dar tudo errado porque o contato e lazer com os pais é imprescindível. É prioridade!

Uma outra forma, que é minha preferida, é de aprender junto com a criança. Estimular sua criatividade e explorar o mundo de mãos dadas com ela. Ensiná-los a serem auto-didatas, a fazer e empinar sua própria pipa - vale procurar como se faz na Internet, num livro, ou perguntar a alguém -, a brincar na natureza, a se exercitar ao ar livre, trepando numa árvore ou nadando num rio, a aprender as leis da física, da química e da biologia na prática, construindo seus próprios brinquedos, uma casa na árvore... enfim, a ter uma curiosidade saudável e uma gana de viver insaciável. De quebra você também cresce como pessoa e volta a ser criança, no sentido mais puro da expressão.

Pelo menos é assim que eu pretendo e gostaria de educar meus filhos. Vamos ver...!

 
Dedico este post a um homem verdadeiramente livre e independente que procura sempre me ensinar a também sê-lo, embora eu ainda esteja engatinhando! Só uma pessoa verdadeiramente livre e que ama de verdade deseja a liberdade daqueles que a cercam.


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